No começo não havia separação entre o Orum, o Céu dos orixás, e o Aiê, a Terra dos humanos. Homens e divindades iam e vinham, coabitando e dividindo vidas e aventuras.
Conta-se que, quando o Orum fazia limite com o Aiê, um ser humano tocou o Orum com as mãos sujas.
O céu imaculado do Orixá fora conspurcado.
O branco imaculado de Obatalá se perdera.
Oxalá foi reclamar a Olorum.
Olorum, Senhor do Céu, Deus Supremo, irado com a sujeira, o desperdício e a displicência dos mortais, soprou enfurecido seu sopro divino e separou para sempre o Céu da Terra.
Assim, o Orum separou-se do mundo dos homens e nenhum homem poderia ir ao Orum e retornar de lá com vida.
E os orixás também não podiam vir à Terra com seus corpos.
Agora havia o mundo dos homens e o dos orixás, separados.
Isoladas dos humanos habitantes do Aiê, as divindades entristeceram.
Os orixás tinham saudades de suas peripécias entre os humanos e andavam tristes e amuados.
Foram queixar-se com Olodumare, que acabou consentindo que os orixás pudessem vez por outra retornar à Terra.
Para isso, entretanto, teriam que tomar o corpo material de seus devotos.
Foi a condição imposta por Olodumare.
Oxum, que antes gostava de vir à Terra brincar com as mulheres, dividindo com elas sua formosura e vaidade, ensinando-lhes feitiços de adorável sedução e irresistível encanto, recebeu de Olorum um novo encargo: preparar os mortais para receberem em seus corpos os orixás.
Oxum fez oferendas a Exu para propiciar sua delicada missão.
De seu sucesso dependia a alegria dos seus irmãos e amigos orixás.
Veio ao Aiê e juntou as mulheres à sua volta, banhou seus corpos com ervas preciosas, cortou seus cabelos, raspou suas cabeças, pintou seus corpos.
Pintou suas cabeças com pintinhas brancas, como as pintas das penas da conquém, como as penas da galinha-d’angola.
Vestiu-as com belíssimos panos e fartos laços, enfeitou-as com jóias e coroas.
O ori, a cabeça, ela adornou ainda com a pena ecodidé, pluma vermelha, rara e misteriosa do papagaio-da-costa.
Nas mãos as fez levar abebés, espadas, cetros, e nos pulsos, dúzias de dourados indés.
O colo cobriu com voltas e voltas de coloridas contas e múltiplas fieiras de búzios, cerâmicas e corais.
Na cabeça pôs um cone feito de manteiga de ori, finas ervas e obi mascado, com todo condimento de que gostam os orixás.
Esse oxo atrairia o orixá ao ori da iniciada e o orixá não tinha como se enganar em seu retorno ao Aiê.
Finalmente as pequenas esposas estavam feitas, estavam prontas, e estavam odara.
As iaôs eram as noivas mais bonitas que a vaidade de Oxum conseguia imaginar.
Estavam prontas para os deuses.
Os orixás agora tinham seus cavalos, podiam retornar com segurança ao Aiê, podiam cavalgar o corpo das devotas.
Os humanos faziam oferendas aos orixás, convidando-os à Terra, aos corpos das iaôs. Então os orixás vinham e tomavam seus cavalos.
E, enquanto os homens tocavam seus tambores, vibrando os batás e agogôs, soando os xequerês e adjás, enquanto os homens cantavam e davam vivas e aplaudiam, convidando todos os humanos iniciados para a roda do xirê, os orixás dançavam e dançavam e dançavam.
Os orixás podiam de novo conviver com os mortais.
Os orixás estavam felizes.
Na roda das feitas, no corpo das iaôs, eles dançavam e dançavam e dançavam.
Estava inventado o candomblé.
São rituais que visam corrigir várias deficiências na vida de um ser humano (saúde, amor, prosperidade, trabalho profissional, equilíbrio, harmonia familiar, etc.) A composição de cada Ebó depende da sua finalidade, e os seus componentes vão desde bebidas a frutas, folhas, velas, adornos, alimentos secos, mel, óleo de palma, louças, artefatos de barro ou ágata., etc..
Chamamos oferendas aos rituais compostos de frutas, alimentos, carnes, bebidas, flores, louças e adereços que servem para oferecer aos Orixás, como uma súplica para se alcançar uma graça, bem como para homenagear e cultuar um Orixá, de forma a fortalecer o nosso vínculo com o mesmo.
Kodidé ou akodide como é chamado pelo povo do santo, é uma pena vermelha, extraída da cauda de um papagaio africano chamado Odíde.
No Brasil tem o nome de papagaio do Gabão ou papagaio-cinzento.
Esta pena é utilizada nos ritos de passagem, na feitura de santo todos carregam em sua testa ou no centro da cabeça, simbolizando a realeza, o respeito e a honra pelo fato de ter se iniciado para ser um novo sacerdote dedicado ao culto dos Orixás possibilitando assim a este individuo o dom da palavra e sabedoria no novo aprendizado do candomblé.
E respeitando o equilíbrio das energias masculinas e femininas pois o vermelho da pena significa e energia feminina em toda sua pureza.
O velho OXALÁ ajoelhou-se, levou a pena de Ekodidé à cabeça e disse:
"Como exemplo da minha gratidão à dedicação de Omo Osun e como reconhecimento da importância do poder feminino para equilíbrio no mundo, a partir deste dia usarei a pena de Ekodidé presa ao centro da testa, próximo à minha coroa".
A atitude grandiosa de Oxalá ao adotar o Ekodidé em sua roupa branca, repleta de pureza e representante da força masculina da vida mostrou a todos a importância do equilíbrio entre o princípio feminino e masculino.
As forças masculina e feminina se complementam e devem sempre permanecer harmonizadas.
É por este motivo, que o único elemento de cor presente na vestimenta de Oxalá é uma pena vermelha
No Candomblé existe uma estreita relação entre a Natureza e todos os ritos a serem seguidos. Cada elemento está devidamente representado, uma cantiga muito interessante é a seguinte:
Agbè lo laró Ki raun aro
Alukò lo lósùn Ki raun osùn
Lékeléke ki lo léfun Ki raun efun
Emi ni yio léke òta mi o
Agbé tem penas azuis, Que nunca lhe falte o azul
Alukò possui penas vermelhas, Que nunca lhe falte o vermelho
Lékeléke tem as penas brancas, Que nunca lhe falte o branco
Que eu fique acima de meus inimigos
É normal no Brasil, por desinformação ou difusão de informações estereotipadas, muita gente associar o Candomblé com bruxaria ou com oportunistas que prometem milagres em troca de dinheiro ou ainda confundirem a cultura negra com superstição ou ideias maléficas. No entanto, esta religião conectada ao universo africano é fruto de uma forte ancestralidade que a qualifica como um conjunto de ideias, mitos, música, dança, roupas e oferendas que existem desde os primórdios da humanidade, merecendo reconhecimento e respeito por sua história e tradição.
Respeitada nos quatro cantos do mundo, a música brasileira recebeu fortes vibrações, diretas e indiretas, do Candomblé, que influenciou desde grupos musicais contemporâneos até manifestações culturais tradicionais que articulam música e dança, no Recife, por exemplo, a maioria dos que participam dos grupos musicais como: os brincantes de Maracatu e Cavalo Marinho, estilos afro-brasileiros, praticam o Candomblé.
O mesmo acontece com membros de grupos de Jongo, Folia de Rei, Bumba Meu Boi, ritmos africanos que não se relacionam diretamente com o Candomblé, mas pela presença destas pessoas em terreiros, acabam se misturando por meio de fraseados e interpretações.
Também temos a herança direta na nossa música, que pode ser percebida em frases geradas pelo agogô no ritmo Cabula, antecedentes diretos do tamborim, presente no Samba de Roda da Bahia e do Rio de Janeiro. Temos ainda os toques do ritmo Iilú, base da caixa da Escola de Samba Estação Primeira de Mangueira.
Outro ritmo fundamental da música feita no Brasil é o Afoxé, produto 100% nacional, que uniu terreiros de diferentes etnias, como o Ketu, Angola e Jeje, e que foi incorporado à MPB por compositores como Gilberto Gil, Caetano Veloso e João Donato etc.
Os ritmos do Candomblé (culto tradicional afro brasileiro) são aqueles usados para acompanhar as danças e canções, dos Orixás, Nkises, Voduns, dependendo da "nação" a que pertencem.
Os Atabaques são os principais instrumentos usados em todos rituais do Candomblé de Jeje, Ketu, Efan, Egbá, Batuque, Moçambique, Tambor de Mina e Angola.
São de origem africana, e tem sua tradução baseada no glossário luso-asiático de Delgado, e originou-se das variantes populares, decorrentes de: TAMBQUE, ATABQUE e ATABAQUE.
Os atabaques no candomblé são objetos sagrados e fazem parte do Axé, e são usados unicamente nas dependências do terreiro, não saem para a rua como os que são usados nos Afoxés, eles são preparados exclusivamente para esse fim.
Os couros dos atabaques, são dos animais que são oferecidos aos Orixás, independente do ritual que é feito para consagração dos mesmos, os couros podem ser comprados e passaram também pelo ritual de osé e só então é que poderão ser usados no terreiro.
O encouramento e tratamento do couro são de responsabilidade dos Ògáns, assim como a confecção dos atabaques que podem ser encomendados em pequenas fábricas especializadas ou em comprados prontos em lojas ligadas à religião.
O som do atabaque é o condutor de Axé do Orixá, sons africanos sem partitura é o que convidam os Orixás para os rituais ou festividades nas casas de santo, cuja execução é da responsabilidade dos Ògáns que utilizam varetas de madeira chamadas de atorís ou Aguidavis.
Na nação Jeje o atabaque maior tem o nome de Rum, o segundo tem o nome de Rumpi e o menor tem o nome de Le, nomes que os identificam e que popularizaram os atabaques.
Os atabaques do candomblé só podem ser tocados pelos Ògáns ou iniciado (nação Ketu), Xicarangoma (nações Angola e Congo) e Runtó (nação Jeje) que é o responsável pelo Rum (o atabaque maior), e pelos Ògáns nos atabaques menores sob o seu comando.
Para completar o ritmo dos atabaques, também é utilizado o Agogô, tocado para marcar e direcionar o Candomblé, que na tradição Alaketu chama-se Gan.
DESCRIÇÕES DOS INSTRUMENTOS
ATABAQUES
São instrumentos de madeira e couro, chamados de ILÚS na Nação Ketu/Nagô, e os Jejes os chamam e que se tornou popular (Run, Rumpi E Lé) (Grave, Médio E Agudo) e desempenham, respectivamente, ritmos cadenciados em sequências de batidas.
Ao contrário do que temos na cultura ocidental, onde os sons graves não ficam na frente, no Candomblé os graves assumem o papel de protagonista.
As frases tocadas pelo Run (tambor solista) não são improvisos, mas estão em consonância com os movimentos do Orixá que recebem as pessoas. Assim, com seus ritmos característicos, cada Orixá expressa suas particularidades seja na linguagem musical quanto na gestual já nos afoxés são tocados com as mãos resultando numa verdadeira orquestra percussiva, não necessariamente o uso de um terno de atabaques, podendo será menos ou mais de um trio de instrumentos.
Curiosidade
Existe uma região na Nigéria, mais precisamente em Osógbò (Oshobô), onde se realiza festas ritualísticas em homenagem à Deusa Oxum, as margens do rio com mesmo nome, lá apenas as mulheres tocam os instrumentos, tendo como base o tambor “agere” muito parecido e conhecido do nosso candomblé da nação Nagô que é o ILÚ (tambor pequeno encourado dos dois lados, preso a ástes de ferro e madeira, que são três, chamados: YAN, MELÊYANCÓ E MELÊ, respectivamente, grave, médio e agudo, que é percutido apenas pelas mãos de homens em nossa cultura os OGÃS), em Irá, região onde nasceu à Deusa Oyá também existem festas ritualísticas nas margens do rio Níger (Odô OYA) em homenagem a este Òrìxá.
“Segundo Manuel Querino, havia várias espécies de atabaques como eram chamados na época: pequenos Batá, grandes Ilú e os atabaques de guerra, bàtá koto, que desempenharam grande papel nos levantes de escravos, na Bahia no começo do século XIX, o que determinou a proibição expressa de sua importação desde 1835.”
As religiões de matrizes africanas há décadas vêm resgatando alguns elementos que por ventura ficaram esquecidos dos meados do ano de 1830 até nossa atualidade. Òrìşá “ÀYÀN/ÀYON”, Òrìşá do tambor, é um desses elementos.
Todo jogo de atabaque antes de ser utilizado, deverá ser passado pelo processo litúrgico, vários ebós, lavagens com as ervas específicas e atins, há imolação para cada instrumento, ficam recolhidos, obedecem a preceitos de acordo com o odú e as regras de cada casa, são sacralizados e em alguns axés, são nomeados e identificados pelo bàbálòrìxá ou ìyálòrìxá, cada um para um determinado Orixá.
Anualmente tomam e participam do osé assim como todos os instrumentos da Casa. Entram de luto com a morte do bàbálòrìxá ou ìyálòrìxá por um ano, após esse período, repete-se os rituais que foram aqui citados.”
AQUIDAVI, ÌSÀN ou ÀTÒRI
São varetas de madeira que são utilizadas para a percussão dos atabaques no candomblé na nação ou cultura Ketu/Nagô.
São confeccionadas com pequenos galhos retos das árvores de algumas sagradas do candomblé, geralmente da GOIABEIRA, ARAÇAZEIRO, BAMBU e MARMELO,
Àtòri ou Ìsàn são nomes dado a estas varas de madeira, medem cerca de trinta (30) a quarenta (40) centímetros, Este objeto sagrado deve ser preparado pelos iniciados do candomblé em especial pelos Ogan, depois de descascados e lixados, devem passar por rituais específicos de sacralização para ser utilizados durante os cultos, cerimoniais e nas festas.
A percussão no Candomblé de Ketu é executada pelo Aguidavis, ou por vezes com uma mão e um Aguidavis, dependendo do ritmo e do atabaque que está sendo tocado. Há nações que não se utilizam dos Aguidavis, o candomblé é tocado apenas pelas mãos.
XEQUERÊ
Instrumento constituído por uma cabaça (fruto vegetal) coberta por um entrelaçado de miçangas (no passado eram utilizados búzios ou ave-marias) que são friccionados pelas mãos dos percussionistas.
AGOGÔ
Instrumento de percussão que rege as batidas do afoxé, o maestro da nossa nação, devido a sua sonoridade marcante, sendo seguido pelo demais instrumento.
Feito de metal possui duas campanas com sons diferentes (e com uma campana é chamado de GAN).
O TOQUE
Tecnicamente, existem diversos tipos de toques, que é o formato da percussão dos atabaques, que varia de acordo com a nação do Candomblé.
Essa percussão pode ser feita com as mãos ou com duas Aguidavis, ou por vezes com uma mão e um Aguidavis, dependendo do ritmo e do atabaque que está sendo tocado.
“Dobrar os couros” – é um repique lento sequencial e cadenciado que é feito para homenagear visitas ilustres que estão chegando ao terreiro, praticamente é o convite para a pessoa entrar.
Durante a festa, quando chegam os convidados ou sacerdotes e Ògás de outras casas, interrompe-se o toque que está sendo executado para os orixás e dobra-se os couros, após a entrada dos convidados o toque é retomado normalmente.
Algumas casas de candomblé não usam dobrar os couros para as visitas, mas para alguns considera-se isso uma honra.
Dobram-se os couros também em outras ocasiões, mas sempre para homenagear.
São cerca de 28 ritmos entre as nações de Ketu, Jeje e Angola.
"No candomblé nós não chamamos de "música". Música é um nome incomum a se dizer, isso todo mundo fala. Chamamos de (ORINS) ... cantigas para o Orixa".
A presença do ritmo no barracão esta associada à dança, que rememora os atributos míticos das divindades. Desse modo, um deus guerreiro, como Ogun, estabelece uma coreografia na qual os movimentos serão ágeis, rápidos e vigorosos, adequando-se ao ritmo executado, diferentemente dos passos lentos, fluidos e ondulantes de Oxum, uma deusa das águas.
Assim, com seus ritmos característicos, os orixás, nkise ou vooduns expressam, na linguagem musical e gestual, suas particularidades, criando uma atmosfera na qual estas se tornam inteligíveis e plenas de sentido religioso. Daí podermos falar dos ritmos mais freqüentes no candomblé em termos do que representam e de sua relação com as entidades às quais homenageiam.
O RITMO
Sucessão de tempos fortes e fracos que se apresentam alternada e regularmente; cadência, compasso
Tem a função de estimular a atividade e a expressão corporal
ADARRUN ou VASSI
O ADARRUN é o ritmo mais citado como característico de OGUN. É um ritmo "quente", rápido e contínuo, que pode ser executado sem canto, ou seja, apenas pelos atabaques. Pode, também, ser executado com o objetivo de propiciar o transe. O toque de bolar, por exemplo, se faz ao som do adarrum.
Apesar de ser caracteristicamente tocado para Ogum, não em sua totalidade, em algumas cantigas também é tocado para os orixás: Exú, Ossaiyn, Omolu, Odé Ode, Xango, Oyá, Iemanjá, Oxum e Oxala.
AGUERÊ
O AGUERÊ é o ritmo de Oxóssi por excelência, é acelerado, cadenciado e exige agilidade na dança, do mesmo modo que a caça exige a agilidade do caçador. não em sua totalidade, em algumas cantigas também é tocado para os orixás: Exú, Ogum, Ossain, Oxum, Xango, Iemanjá.
ALUJÁ
ALUJÁ É a dança preferida de Xangô, que se faz ao som do Alujá, um ritmo quente, rápido, que expressa força e realeza recordando, através do dobrar vigoroso do Rum, os trovões dos quais Xangô é o senhor, em sua dança Xangô conta toda sua história de luta e de seu reinado. é utilizado para Cantigas do Orixá Xangô.
OPANIJÉ
O ritmo de Omolu é o OPANIJÉ, um ritmo pesado, "quebrado" (por pausas) e lento. Este ritmo lembra toda a trajetória e de vida deste orixás das epidemias, que é ligado à terra.
BRAVUM
O BRAVUM, embora não seja atribuído especialmente a algum orixá, é um ritmo relativamente rápido, bem dobrado e repicado. É frequentemente escolhido para saudar Oxumarê, Ewá.
SATÓ
SATÓ, um ritmo vagaroso, dobrado e pesado, Expressa em sua dança a caçada de uma cobra movendo-se de lado a outro como se estivesse sempre a procura e atenta a qualquer situação, assim como em sua luta onde se observa o bote de uma serpende é frequentemente tocado para Oxumare e Iyewa.
IJEXÁ
IJEXÁ, o único ritmo tocado com as mãos no rito Ketu é, por excelência, o ritmo de Oxum. É um ritmo calmo, balanceado, envolvente e sensual, como a deusa da água doce, à qual faz alusão. Ele é tocado ainda para o orixá Oxum, Logun-Edé e, não em sua totalidade, em muitas cantigas também é tocado para os orixás Exu e para Oxalá.
DARÓ
Para OYA, divindade dos raios e dos ventos, toca-se o DARÓ, termos que designam um mesmo ritmo que, de tão rápido, repicado e dobrado, também é conhecido vulgarmente como "quebra-prato". É o mais rápido ritmo do candomblé, correspondendo à personalidade agitada, contagiante e sensual desta orixa guerreira, senhora dos ventos e que tem poder de afastar os espíritos dos mortos (eguns).
BATÁ
O BATÁ, talvez um dos ritmos mais característicos do candomblé, pode ser tocado em duas modalidades: batá lento e batá rápido, sendo o primeiro executado para os orixás cuja dança comedida denota certas características de suas personalidades, como a dança de Oxalufã, o deus arcado e velho que, com seu Opaxorô (cajado), criou o mundo.
Significativamente, o termo batá, designa também o tambor de duas membranas, afinadas por cordas, cujo uso nos candomblés do Norte e Nordeste do Brasil é tão difundido que talvez por este motivo o ritmo tenha tomado seu nome, ainda quando não executado por este instrumento.
KORIN EWE
KORIN EWE, é um ritmo exclusivo do orixá Ossaiyn, conhecido como "sassanha" o Korin Ewe e tocado de uma forma lenta / pesada e rápida ao mesmo tempo dependendo de sua cantiga, a dança traz um significado das folhas se batendo ao vento. sendo de Orixá Ossaiyn e um orixa essencial, nos so candomblé trazemos a velha maxima:
"Kosi ewe, Kosi Orisa"
"Sem folha, sem orixa"
Sendo muito importante dentro de nosso rito.
HAMUNHA
HAMUNHA, é um outro ritmo, também conhecido por: VAMUNHA, RAMONHA, VAMONHA, AVAMUNHA, AVANIA OU AVANINHA, tocado para todos os orixás. É um toque rápido, empolgado e tocado em situações específicas como a entrada e saída dos filhos de santo no barracão e para a retirada do orixá em transe.
É nesse momento que o orixá saúda os pontos de axé da casa e se retira sob a aclamação dos presentes. Este ritmo também e tocado para alguns orixás sendo eles, Ogun, Omolu, Oxumare, Iroko.
Todos os ritmos que acabei de mostrar a voces são característicos do rito Ketu e, associam letra, melodia e dança que, integrados, “narram" a experiência arquetípica dos orixas, vividas em nível individual e grupal, cujo ápice é o transe.
Alguns destes ritmos são tão personalizados dos orixás que podem dispensar as letras ou mesmo a dança como elemento de identificação. É o caso do Alujá, do Opanijé e do Daró, consagrados a Xangô, Omolu e Oya, respectivamente.
As condutas e protocolos são fixados por intermédio de tabus comportamentais, de alcance pessoal e também coletivo, que compõem o chamado hunbe. A partir deste conceito, se estabelece uma “educação de àṣẹ”, capaz de identificar a postura daquele que é, ou não iniciado.
O hunbe é transmitido ao neófito pelo(a) sacerdote(isa) e pelos(as) detentores(as) de cargos próprios dentro da estrutura hierárquica do terreiro.
Entretanto, este regramento comportamental é também pedagogicamente ensinado a cada gesto, a cada exemplo corriqueiro e despretensioso de todos os membros da comunidade.
O hunbe é compreendido como um código oral de procedimentos e protocolos de comportamento sócio religioso ensinado cotidianamente aos adeptos do Candomblé.
As normas do hunbe, servem para balizar os adeptos, dentro e fora do espaço do terreiro.
Existem algumas variações entre as regras de hunbe nas diversas casas de Candomblé, conforme suas origens e tradições.
No Àsé Dan Fè Èrò, o hunbe elenca cerca de 50 mandamentos comportamentais com tópicos e sub-topicos, dentre aqueles de alcance pessoal; os de âmbito coletivo; os de prática no terreiro; os de cumprimento fora do terreiro; os religiosos; os profanos e os hierárquicos.
As regras de hunbe são mescladas entre questões antigas e modernas, bem como entre conceitos de ética e moral (temporais e atemporais) e ainda norteadoras de procedimentos profanos e religiosos.
As normas do hunbe abrangem, entre outras questões:
exemplos:
“não deixar louça suja na pia à noite”;
“não sentar de costas para a rua”;
“não tatuar o corpo”;
“não cuspir no chão”;
“não consumir alimentos ou bebidas que sejam interditos do seu orixá”;
“respeitar os mais velhos”;
“dedicar-se e participar dos ritos ao seu orixá”;
evitar quaisquer vícios;
“não andar sujo, com roupas amassadas ou rasgadas”…
O hunbe é, assim, um compêndio de normas para disciplina do corpo e do espírito.
Este código é ensinado dentro do ambiente de terreiro, mas possui alcance também em ambientes externos. O propósito do hunbe é educar o adepto para a vida religiosa e profana. O hunbe educa o corpo para que este se comporte aonde ele transitar.
A origem do hunbe mescla orientações de cunho diretamente espiritual e também ordenamentos administrativos emanados do(a) sacerdote(isa)
O destino do corpo individual está, até certo ponto, entrelaçado ao destino do “corpo coletivo”. Razão pela qual, os regramentos do hunbe são individuais, com efeitos coletivos e vice versa.
Podemos compreender o hunbe como um sistema de regras sócio religiosas, calcado no princípio pedagógico da disciplinarização da vontade.
O hunbe identifica os adeptos do Candomblé. Agir com educação de axé orgulha a comunidade, a religião e ajuda a preservar princípios e tradições importantes. Em uma sociedade que já não valoriza os idosos, no Candomblé os mais velhos ainda possuem respeito e consideração.
Hunbe é a transmissão cotidiana da memória ancestral.
A entrega do deká, é o ápice da iniciação no Candomblé. Após os sete anos de iniciação, o até então Iaô deverá fazer sua obrigação correspondente e, se tiver em seu destino a função de abrir uma nova Casa, receberá então seu deká (na Nação Ketu, constituindo-se de uma bandeja com os atinentes elementos) ou sua Cuia (na Nação Jeje, sendo a própria cabaça – Àkérègbè, cortada acima do meio em forma de vasilha com tampa, transformando-se em igbaxé, para colocar-se os símbolos).
Apesar desta diferenciação étnica, face ao acentuado sincretismo e integração entres as diversas Nações, tal nomenclatura e procedimentos não são tão rígidos, observando-se diversificação em várias Casas.
Com a obrigação de sete anos (odú igê), o Iaô passa à categoria de ebômi, ou vodunsi.
O recebimento da cuia, habilita o portador a abrir seu próprio Candomblé, embora não obrigue o novo ebômi a abandonar seu atual Barracão.
A cuia, portanto, contém os elementos simbólicos e necessários à abertura de um novo Candomblé, tais como uma tesoura, uma navalha, búzios, contas, folhas, uma faca, um ekodidé, etc.
A entrega do deká e/ou a exclusiva obrigação de sete anos, são muito esperados pelos filhos-de-Santo, posto que garantem grande elevação na hierarquia do Candomblé. Contudo, devemos ressaltar a importância e as responsabilidades que este passo requer.
Entre os vários deveres intrínsecos, destaca-se a tarefa de zelar pelo Culto, pela Religião, mantendo seus conceitos, preceitos, e corrigindo deformidades que denigrem o Candomblé.
Ao contrário do que muitos supõem, o Candomblé não é uma religião aética ou amoral. Desde os mais remotos tempos na África, já consideravam-se importantes conceitos de moral, ética, tabus (ewós – interdições) e até uma espécie de mandamentos yorubanos.
Segundo a tradição yorubá, a origem dos deveres morais provém da Divindade Suprema (Olorum ou Olodumare). Olodumare colocou nos Homens o Ifá Àyà (O Oráculo do Coração ou Oráculo Interior), o que seria sua orientação ética e moral inatas. Uma pessoa seria boa ou má conforme ela corresponde ou desobedece ao seu Oráculo Interior, à sua consciência.
A busca pela boa conduta seguindo à consciência e às leis superiores, confere ao Candomblé seu “status” de religião, a medida que liga o Homem a Deus (“religare”), proporcionando a melhora do indivíduo.
A concepção de OMOLÚWABI (“filho do bom caráter”), expressa o princípio yorubano de que o cidadão deve respeitar aos mais velhos, ter lealdade para com os pais e para com a tradição, honestidade, hospitalidade, coragem, devoção, paciência, verdade, assistência aos necessitados e desejo irresistível ao trabalho, a fim de manter ilibado seu nome e o de sua família (entenda-se inclusive a de Santo).
O mais importante valor do povo Yoruba é o caráter, que é o maior atributo do homem. A palavra iwà vem do verbo wà – Existir, Ser. Odùnrin náa ní ìwà, Aquele homem tem um bom caráter. O indivíduo qué ìwà pèlé não entra em choque com nenhuma força humana e supernatural, vive em plena harmonia com todas as forças do universo. E este fato tem um forte peso no julgamento divino e define o bem estar na terra e o nosso lugar futuro após a nossa morte ou renascimento. Olódùmaré o Deus supremo e conhecido como Olúmònokàn, “aquele que conhece todos os corações”, que tudo sabe e tudo vê, e o seu julgamento é correto e absoluto.
Ìwà nikàn l’ ó sòro o
“Caráter é tudo o que é necessário.”
Eni l’ orí rere tí kò n’ iwà, ìwà l’ o máa b’ orí rè jé.
“Uma pessoa de bom orí, que não tenha caráter, irá arruinar o seu destino.”
Havia também entre os povos Bantos, um conjunto de normas que proibia, entre outras coisas, provocar o aborto, injuriar, cometer adultério, praticar incesto, tudo visando resguardar a moralidade da família.
Alguns provérbios bem revelam isto:
Ebí jàre òle – O homem indolente é o único responsável por sua fome.
Ìsé kó gbékún – Choro não é resposta para pobreza.
Àìfágbá féníkan, kò jé ayé é ó gún – Faltar com respeito à autoridade é a origem dos conflitos do mundo.
Ìwà nikàn l’ó sòro o – O caráter é tudo o que é necessário.
Reza a tradição que Olofin, chamou a todos os homens ao pé de uma montanha para ensinar-lhes as leis, já que não as conheciam. Chamou pobres e ricos, grandes e pequenos, mulheres e homens, alertando-os se quisessem compartilhar com eles suas aldeias que tinha no céu. E deu-lhes seus MANDAMENTOS:
“Não roubarás nada dos outros
Não matarás a quem não tenha lhe causado dano, nem os animais que não precises para teu sustento
Não comerá a carne do ser humano
Viverás em paz com teus irmãos
Não desejarás nada de seus amigos, nem mulher; o que desejares deverás obter de teu esforço
Não amaldiçoarás o meu nome. Respeitarás pai e mãe. Não pedirás mais do que posso dar-te e te conformarás com teu destino no mundo.
Não temerás a morte, nem tampouco a buscarás por tuas próprias mãos. Transmitirás meu mandamento a teus filhos e filhos de teus filhos.
E por último, que minhas leis sejam respeitadas, se não o fizeres conhecerás meu castigo.”
O filho-de-santo, então deve ser orientado, desde sua tenra iniciação, a respeitar estes conceitos, a fim de manter a honra de seu nome e evitar que algo o desabone, bem assim o de seu egbé (sociedade).
Para bem utilizar o deká, é fundamental ser um omolúwabi.
A transmissão destes conceitos, se dá através da tradição oral, dos provérbios, orikis, itãns, canções e, principalmente, por via da aplicação prática.
Não basta possuir o título de ebômi para merecer respeito. É necessário angariar respeito pelos seus gestos e atos. Ao contrário, o respeito será apenas formalidade hierárquica.
É uma falha do zelador não reconhecer a conexão entre a moralidade e a religião. Isto o leva a entender que tudo se resolve através de ebós. No entanto, grande parte das vezes, o consulente está descumprindo normas religiosas, tais como aquelas acima elencadas, e assim desagradando aos Orixás. Nestes casos, antes de qualquer coisa, deverá corrigir sua conduta para, posteriormente, avaliar-se o cabimento de algum ebó de apaziguamento.
Fundamental também, é entender que apesar de alguém sofrer injustiças, não deve fazer justiça com as próprias mãos.
Fí ìjà fún Olórun já fí owó l’éran – Entregue nas mãos de Olorun para que ele o defenda.
O mal não se combate com o mal. Ao contrário do que se pensa e do que muitos praticam, não se deve pedir a nenhuma Divindade vingança. Nem mesmo agradar Exú para que este faça mal a terceiros.
Exú é o guardião, é o instrumento do equilíbrio da justiça. É o princípio da comunicação, da ordem, do equilíbrio e da harmonia universal. Aí também a energia criadora de Exú. De tempos em tempos, compete a Exú inspecionar o trabalho das pessoas e Divindades, relatando a Olodumare. A Exú cabe aplicar o que couber aos transgressores. Contrariar a isto, será subverter-se à ordem desperdiçando axé e comprometendo-se a si próprio, posto que um erro não justifica outros.
Alertamos no sentido de que todos os envolvidos em trabalhos maléficos (inclusive os de vingança), estarão sujeitos a pagar pelo mal, tanto os que requisitam, quanto os que executam.
Nestes casos, deve-se consultar o jôgo de búzios e verificar o que é mais recomendável, se trabalhos de proteção, afastamento, oferendas, fortalecimento, etc., jamais realizar ebós para o mal.
O guardião da moral do Candomblé, é Oxalá. Seu próprio nome primordial assim o define: Obàtálá – O Rei cuja roupa é branca, ou o Rei que possui honra. A ética e a moral, infelizmente tão esquecidas no Candomblé, são zeladas na brancura de Oxalá e podem ser assim resumidas:
O caráter (ìwà), é o maior dos valores morais e o maior atributo do Homem. Quem tem bom caráter não colide com nenhuma força humana ou sobrenatural, vivendo em perfeita harmonia com o mundo.
A bondade (oore), considerada uma grande virtude, sobretudo quando gera hospitalidade e generosidade. Para o povo yorubá, fazer o bem é a grande realização diária.
A paciência (sùúrú), é entendida como o fator primordial para evitar precipitações que decorram na perca de caráter. A paciência é o primeiro filho de Olodumare e o pai do caráter.
A promessa (Ìbúra), é igualmente um dos mais importantes itens, sobretudo porque desde a iniciação, a pessoa cria vínculos de promessas à Casa e a sua Divindade.
O respeito (Òwò), a que todos devem entre si, sobretudo aos mais velhos pela sua antiguidade e experiência.
Ser verdadeiro (Olóòtòo), é uma virtde essencial de uma comunidade.
Ser justo e sincero (Olóòdodo).
Fazer caridade (Ìféni).
Respeitar os tabús (Èwò), é também de grande importância. Não se deve transgredir as determinações do que deve ser feito, evitado, comido, vestido conforme a vontade das Divindades, sob pena de gerar as chamadas kizilas.
A literatura de Ifá, é a maior fonte deste valores.
Deve-se conhecer, praticar e orientar aos consulentes quanto às normas de conduta morais e éticas, tanto para cumprir a função religiosa inerente ao Candomblé, quanto para agradar às Divindades e para a melhora da Sociedade. A consulta a qualquer oráculo, opelê ifá, búzios, alobassá, orobô, inhame (íyan), obi, etc., não deve ser vista como a solução para todos os problemas, mas o meio pelo qual se vê, ou se previne do que está errado, buscando meios de trentar reverter ou amenizar. Importante entendermos por “errado” também as condutas incompatíveis com a ética e a moral das Divindades, e consequentemente da Religião.
Os preceitos éticos e morais devem também nortear os vodunsis quando estes se prestarem a consultar um oráculo para atender a um consulente. Diante disto, não se deve faltar com a verdade; deve-se Ter precaução com o que se diz e como se diz; deve-se agir com bondade objetivando a caridade; e sobretudo deve-se Ter fé, para que a intuição seja norteadora da consulta junto às divindades.